Por Renata Dal-Bó
Semana passada comecei uma série chamada “Cronistas de Minha Vida”, na qual falo sobre os (as) cronistas que influenciaram na minha formação como leitora e escritora. Abri a série falando sobre um dos primeiros e maiores cronistas brasileiros: Machado de Assis.
Hoje falo sobre uma mulher que foi uma grande cronista, contista, romancista e educadora do século XIX, pioneira não só nas letras como também no feminismo: Nísia Floresta Brasileira Augusta (pseudônimo da norte-rio-grandense Dionísia Gonçalves Pinto. Nísia nasceu em Papari (hoje Nísia Floresta), no Rio Grande do Norte, em 1810, e faleceu em Rouen, na França, em 1885. Foi uma das primeiras mulheres brasileiras a romper os limites do espaço privado e a publicar textos de diferentes gêneros em jornais da chamada grande imprensa.
Segundo a pesquisadora Constância de Lima Duarte, a literatura de autoria feminina, a consciência feminista e a imprensa de mulheres surgiram praticamente ao mesmo tempo no Brasil. E os jornais foram o espaço privilegiado para que essa produção letrada feminina viesse à tona, num trabalho, de certa forma pedagógico, que visava a conscientização da sociedade sobre o papel da mulher e a necessidade de transformação de sua condição, para que ela ocupasse mais ativamente os espaços públicos. O surgimento de periódicos dedicados ao sexo feminino e, posteriormente, produzidos por mulheres, criaram condições para o aparecimento dessas escritoras.
Nísia foi pioneira na escrita feminina e na luta pelo espaço da mulher na sociedade do século XIX. Ao longo de sua obra, delineou um projeto político em prol da defesa dos direitos femininos. Começou a colaborar nos jornais, em 1830. No “Espelho das Brasileiras” ela escreveu artigos sobre a condição feminina. Para Nísia, o progresso de uma nação dependia da posição que a mulher ocupava na sociedade. Num dos artigos, ela escreve:
“Uma parte das nossas mulheres continua estacionada na vida caseira, exposta às enfermidades que ela acarreta, e passa a vida em indolente indiferença, ou entregue ao trabalho, que a falta de método torna árduo e muitas vezes sem proveito real.”
Por tudo o que defendeu, Nísia foi vítima da difamação e esquecimento. O pouco que se ouvia falar dela, estava marcado pelo preconceito. O fato de estar à frente de seu tempo custou-lhe, com certeza, o não-reconhecimento de seu talento.
Apenas no final do século XX começou a se tornar um pouco mais conhecida, graças, principalmente, ao trabalho de resgate e de recuperação de autoras e obras do passado que foi realizado por pesquisadoras e críticas literárias femininas, como Constância de Lima Duarte, citada acima, e Zahidé Lupinaci Muzart.
São mulheres, como Nísia, no século XIX, e Constância e Zahidé, no século XX, que abriram caminho para a escrita de uma nova história da literatura, na qual, cada vez mais, a voz da mulher, silenciada ao longo dos séculos por construções sociais e culturais, ecoasse com a autonomia que lhe é merecida.
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Fonte: FLORESTA, Nísia. Passeio ao Aqueduto da Carioca. In: DUARTE, Constância Lima (Org.). Inéditos e dispersos de Nísia Floresta. Natal: EDUFRN/NCCEN, 2009, p. 43-44.
MUZART, Zahidé Lupinaci. (org.) Escritoras Brasileira do Século XIX. 2. ed. Santa Cruz do Sul: Mulheres, 2000.
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