Por Jairo Lima
Tento entender as razões que fazem uma pessoa acreditar, crer independente da natureza do cenário, das realidades visíveis e perceptíveis e das contradições que esse caldeirão pode representar. Talvez seja autoindulgência, talvez algo menos telúrico. Talvez seja apenas o próprio reflexo no espelho. Digo isso porque vivemos quadros desajeitados na pintura e desajustados na forma e, mesmo assim, não lhes faltam adoradores. E o maior exemplo está sentado na cadeira da presidência da república.
Durante a campanha o discurso era “contra tudo que está aí”, contra a velha política, e a turma acreditou. Falou-se contra a corrupção e contra o famigerado toma-lá-dá-cá, a turma acreditou. Mesmo com instituições e mecanismos de controle domesticados (COAF e PF, por exemplo) e até a parceria amorosa com o centrão, a turma seguiu acreditando.
Veio a pandemia e a conversa foi: “não passa de uma gripezinha” ou “vão morrer no máximo 2 mil pessoas”. Pois a turma acreditou. Depois disse que não havia falado e a turma também acreditou. Sobre o dinheiro na conta da mulher e as denúncias de peculato familiar nenhuma explicação, nenhuma palavra, nada e mesmo assim, a turma acreditou.
Chegamos à CPI da Covid e algumas respostas aparecem, misturadas com outras tantas perguntas. Tentar alterar a bula de um medicamento – cuja ineficácia é comprovada – para impor aos brasileiros como remédio milagroso é digno de cabeças doentes. Não há até aqui palavras sobre isso. E nem precisa. Sabe-se que aquela velha turma da credulidade incontinente mantém o estoque de fantasias em dia.
Depois veio a história da oferta de vacinas que os donos do poder nem se dignaram a responder. Como resultado, vemos o atraso na vacinação dos brasileiros e uma escalada brutal de mortes evitáveis. Nenhuma palavra sobre isso também, mas, por certo, independente dos argumentos, alguns vão acreditar. Estes são os mesmos que acreditaram que era apenas uma gripezinha, que ninguém morreria se aderisse ao tratamento precoce, que o “paladino da nova ordem” acabaria com a corrupção e as negociatas com o Congresso.
Vale lembrar ainda o orçamento sinistro e secreto patrocinado pelos bacanas. A bagatela de 3 bilhões escamoteados para atender alguns parceiros. Isso tudo ao mesmo tempo em que a Universidade Federal do Rio de Janeiro anuncia severas restrições operacionais e o cancelamento de várias unidades de serviços e de pesquisas. A turma dos amigos do rei toma o dinheiro do povo enquanto outras 10 universidades federais confirmam limitações orçamentárias e dificuldades para manter as suas portas abertas.
Nem precisa justificar o engodo do orçamento aprovado para este ano de 2021. Não adianta saber que o mês de abril registrou a maior taxa de desmatamento no país e que o Congresso, com as bênçãos do presidente, avacalhou a lei de licenças ambientais. Isso tudo depois daquele encontro sobre o clima promovido pelo presidente dos EUA. Apesar do histórico perverso e recheado de mentiras, a velha-guarda do credo flácido nem sabe mais no que acredita, mas acredita mesmo assim e segue firme a jornada na trilha do atraso e da ignorância.
Por fim, o novo embate se dará em torno do voto impresso. Alguma novidade sobre o futuro? Retomo o título deste texto, agora sem a vírgula: eu não acredito.
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