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ACRE EM NOTAS | O que o amor calou, a justiça começa a ouvir

Entre o silêncio imposto e a resistência possível, é hora de parar de normalizar o inaceitável

02/07/2025 às 15h27 Atualizada em 03/07/2025 às 15h32
Por: Redação Fonte: Acreaovivo.com
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ACRE EM NOTAS | O que o amor calou, a justiça começa a ouvir

Por Socorro Camelo e colaboradores*

Trágica repetição

Entra dia, sai dia, nada muda. E mais uma mulher é vítima de feminicídio no Acre, apesar de tantas campanhas e iniciativas. Dessa vez, a enfermeira Jonnavila Ruanna Mendes da Silva, de 32 anos, que morreu depois de ser espancada e levada pelo próprio agressor à UPA, onde faleceu de parada cardiorespiratória de tanto que apanhou.

Agressão

A enfermeira vivia em uma espiral de violência que premeditava o final trágico. Primeiro, o companheiro a afastou de amigas e parentes, passou a implicar com suas roupas, exigiu que ela andasse de saia blusa compridas, que serviam também para esconder os hematomas das surras que levava. Seu telefone era controlado e até com o emprego o homem implicava, querendo uma mulher inteiramente submissa a sua vontade. E, apesar de todos os sinais, de todas as campanhas de conscientização, ela aceitava por amor. Terminou como previsto, com a morte da enfermeira.

O que fazer

Esse caso levanta a questão do que fazer nesses casos de submissão e controle. Quando a vítima perde a perspectiva de reagir, quando é dominada ao ponto da subserviência total, cabe à família, aos amigos, tomar a frente e denunciar. Já não se pode admitir a história de que em briga de marido e mulher ninguém mete a colher. 

Lei Joyce Araújo

A deputada Socorro Neri tem uma importante contribuição nesse debate. Propôs a lei que pune o estelionato sexual, baseado no caso Joyce Araújo, que foi induzida ao suicídio, depois de ser extorquida pelo homem que acreditava ser seu noivo. Já é mais um avanço, mas tanto a legislação, quanto as medidas de proteção e o alerta da família e amigos, precisam avançar muito.

Educação

Seria preciso ampliar nas escolas o acesso a informações sobre formas de dominação da mulher, de valorização das meninas e moças e de incentivo à denúncia em caso de violência, ameaça e indução.

Violência

Os dados são estarrecedores. Entre janeiro e maio de 2025, o Acre contabilizou 2.437 registros de ocorrências de violência doméstica. Esse número inclui casos consumados e tentados. A informação é do painel de acompanhamento do Ministério Público do Acre, que utiliza informações do Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública e da Polícia Civil. São, em média, 16 casos por dia! Para um população de 800 mil pessoas em todo o estado.

Aumento

É um aumento em relação ao mesmo período de 2024, que já havia registrado 2.371 casos. Ou seja, a violência doméstica continua fora de controle, mesmo com todas as ações federais, estaduais e municipais.

Quadrilha

Essa semana uma quadrilha com ramificação em onze estados foi desbaratada. Eles se especializavam em induzir meninas de 11 a 14 anos à automutilação e ao envio de fotos e material sexual, sob ameaças de divulgar o que tinham armazenado delas. A prisão só foi possível porque uma garota contou as ameaças à mãe, que levou o celular da filha à polícia.

Pornografia

Quando prenderam os líderes da quadrilha, encontraram mais de 60 mil pastas com pornografia infantil e ameaças. Os bandidos lucravam com lives pagas mostrando o processo de automutilação. É isso que acontece nos desvãos de internet e destrói a vida de centenas de meninas, inclusive as pré-adolescentes.

Fake News

O governo do estado foi vítima de fake-news. Uma quadrilha tem divulgado amplamente nas redes sociais postagem em que anuncia venda de camarotes e áreas vip para os shows da Expoacre. Teve gente que caiu no golpe e mandou pix para os bandidos. Uma nota oficial foi distribuída, alertando que não há ainda venda de entradas para a Expoacre e que os únicos canais responsáveis são os do governo. O problema é a diferença de alcance, entre a nota do governo e o impulsionamento do fake pelas redes.

Novo embate

A ministra do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas, Marina Silva, foi alvo de novos ataques durante audiência na Câmara dos Deputados. Convocada por Evair de Melo a comparecer na sessão, o próprio parlamentar chamou a ministra de “mal educada” e ainda disse que Marina tem dificuldades com o agronegócio porque nunca trabalhou e nunca produziu. “ a senhora não sabe o que é prosperidade construída pelo trabalho” criticou o deputado.

Lição

Até quando deputados e senadores vão insistir em tentar expor e atacar Marina? Nenhum tem legitimidade para falar dela. E sua vida absolutamente coerente e honesta fala por ela. Em sua fragilidade física, Marina tem uma couraça moral que ninguém penetra.

Institucional

Marina, que já acumula anos de resistência em ambientes hostis, classificou o episódio como uma agressão institucional e com razão. Quando o debate se converte em ataque pessoal, perde-se a compostura e o propósito.

Marina já declarou em outras ocasiões que sua origem incomoda. Mulher, negra, amazônida, tudo isso parece ser demais para quem ainda acha que política é espaço reservado a perfis padronizados.

Deslegitimar

O que está em jogo não é apenas a pauta ambiental. É a tentativa recorrente de deslegitimar uma figura pública que ousa existir fora do script masculino agressivo que tanto contaminou o debate político.

A pergunta que fica: até quando a Câmara dos Deputados vai normalizar esse tipo de comportamento? Já passou da hora de o Conselho de Ética agir com a mesma rapidez que alguns parlamentares têm para agredir. É preciso restaurar o respeito e o mínimo de civilidade nos espaços públicos.

Seca e alagamento

Enquanto o Acre espera uma das grandes secas de sua história, o rio Acre esta com dois metros de água, vastas regiões do Amazonas sofrem com alagamentos fortes. É preciso lembrar o que se aprende na escola, dos afluentes do Solimões/Amazonas da margem direita e margem esquerda. Enquanto a bacia do Purus, Juruá, Madeira, na margem direita, sofrem com a seca, o rio Negro está alagando Manaus, além de outras povoações. Mesma coisa com o rio Trombetas e Japurá. São as mudanças climáticas acontecendo às nossas vistas.

Reparação

Em decisão recente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu o direito de uma mulher à reparação por desequilíbrio patrimonial após o fim de uma união estável. O caso é emblemático: ela abriu mão da carreira para cuidar da casa e apoiar o companheiro por décadas. Quando o relacionamento terminou, ele ficou com o patrimônio. Ela ficou com o vazio, das renúncias, das oportunidades que não voltam.

Sim

O STJ decidiu que sim: abrir mão da vida pessoal, da autonomia financeira, dos próprios sonhos, para sustentar a estrutura emocional e prática de uma família, gera impacto. E esse impacto pode e deve ser reparado.

Dar voz

Como jornalista, não me cabe fazer pareceres jurídicos. Mas me cabe e me comprometo a dar voz a histórias de mulheres injustiçadas. Esse caso, embora tenha nome e número de processo, fala de algo que vai além do tribunal. Diz respeito a cultura, de silenciamento, de um modelo social que ainda trata o esforço feminino como “amor” e o esforço masculino como “conquista”.

Sem existir?

Quantas mulheres você conhece que deixaram seus diplomas na gaveta para acompanhar o marido em outra cidade? Quantas abriram mão da própria renda para cuidar dos filhos?Quantas sustentaram emocionalmente o lar e foram chamadas de “sortudas” por não “precisarem trabalhar”?

Precedente

Elas estavam trabalhando. Só não havia contracheque. Mas havia cansaço, desgaste, esvaziamento. E, agora, há um precedente. A decisão do STJ é um recado discreto, mas poderoso: a justiça começa a escutar o que o amor calou. Que esse caso sirva de espelho e alerta. Que ele diga, para quem ainda duvida: apoio tem valor. E valor merece reconhecimento.

*Socorro Camelo é jornalista e escreve neste espaço as segundas, quartas e sextas-feiras.

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