Por Socorro Camelo e colaboradores*
Privilégio ?
Talvez por envolver pessoas de alto poder aquisitivo e de expressão social, a apuração da morte da advogada Juliana Chaar, atropelada após uma briga na saída de um bar de elite, na capital, anda a passos de jabuti. O motorista do veículo que a matou diz que vai se apresentar em breve, e nenhuma diligência é feita para encontrá-lo e prendê-lo como o fugitivo que é. Os colegas advogados, que deram tiros no meio da briga, são tratados como vítimas quando foram, no mínimo, corresponsáveis. São as vantagens de quem tem dinheiro, bons contatos e o privilégio de nunca ser visto como suspeito.
Café
O assunto da semana, sem dúvida, foi a inauguração do complexo industrial do café em Mâncio Lima. Chegaram a anunciar a vinda de Lula, depois de Geraldo Alckmin, para a entrega da estrutura completa de apoio a pequenos produtores cooperados. Nenhum dos dois veio e nem por isso o ato foi menos importante.
Cooperativa
Quando se pensa que a Cooperativa dos Produtores de Café do Juruá tem perto de três mil participantes, começa-se a entender o fenômeno de mudança cultural que o café representa naquela região e, por extensão, em todo o estado. São produtores que saíram, em sua maioria, das culturas anuais de subsistência para uma atividade empresarial, com modernas técnicas de cultivo, colheita, beneficiamento e comercialização. Das roças tradicionais de arroz, milho e mandioca para a lógica de mercado.
Tecnologia
A presença da tecnologia de ponta começa na escolha dos cultivares mais adaptados, produtivos e de alta qualidade, em trabalho exemplar da pesquisa agropecuária da Embrapa. Depois, os cuidados com o plantio, as normas para a colheita seletiva e a secagem garantem um produto de alto valor agregado. Hoje, a qualidade do conilon produzido no Acre não deixa nada a dever aos melhores do país e, em muitos casos, supera. Espírito Santo, Vietnã, Indonésia: podem começar a olhar pra cá com mais respeito.
Futuro
O que a experiência do café no Juruá mostra é que, se governos e mercado acreditarem no potencial da pequena produção familiar com terra, crédito, apoio técnico e segurança jurídica a cooperativa rural será cada vez mais o caminho do desenvolvimento com raiz, rosto e identidade.
Carbono
Muita gente, especialmente entre ambientalistas que se julgam únicos detentores do futuro da Amazônia, ainda olha com desconfiança a política de créditos de carbono. Mas já passou da hora de vencer essa má vontade. A proposta que está em curso é sólida, ambientalmente justa, socialmente relevante e tecnicamente bem feita.
Jurisdicionais
No Acre, o governo Gladson Cameli centralizou a política do REDD+ e dos créditos de carbono na Secretaria da Fazenda e na CDSA (Companhia de Desenvolvimento de Serviços Ambientais). Chegou-se a acusar essa decisão de comprometer a floresta. Aconteceu o contrário. As ações foram concentradas nas chamadas operações jurisdicionais sob controle público, em terras indígenas, reservas e áreas extrativistas com foco em quem vive, cuida e depende diretamente da floresta. Crédito não pode ser só promessa internacional. Tem que chegar à mão de quem preserva de verdade.
72%
Em discussões realizadas com representantes dos povos indígenas em todas as regiões do estado, ficou pactuado que 72% dos recursos obtidos com créditos de carbono em áreas indígenas serão divididos entre os vários povos. Os percentuais também contemplam extrativistas, colonos de pequenas glebas e ribeirinhos. O governo ficará com 28%, ainda menos que os 30% recomendados, para custear a fiscalização, controle e operacionalização dos projetos.
Qualidade
É inegável a tradição, que veio de governos anteriores, e qualidade do projeto REDD+ do Acre, que põe o estado na vanguarda da pauta ambiental do país. Agora, na semana passada veio uma notícia que reforça essa posição de respeito às normas técnicas dos projetos e da qualidade do serviço proposto.
Certificadora
O governo do Acre contratou a maior empresa certificadora do mundo para avaliar os programas estaduais. A empresa faz o que se chama de “rating”, uma classificação de qualidade. As notas mais altas, buscadas pelo Acre, são as classificações AA e AAA, que podem aumentar o retorno na venda dos créditos. Quem se submete a essa avaliação rigorosa internacional, não pode ter nada a esconder..
Carbono com lógica
Ao apresentar a emenda que salvou o setor de resíduos sólidos e saneamento básico do rótulo injusto de “grande emissor”, o senador Alan Rick conseguiu o que parecia improvável: lógica num projeto ambiental. A proposta original do PL 182/2024 tratava como vilões justamente aqueles que ajudam a mitigar os danos. A emenda, aprovada com 52 votos, corrigiu a rota e virou parte da Lei 15.042/2024.
Não é vilão
Na prática, o setor de reciclagem evita poluição, gera empregos e contribui para a descarbonização do país. A mudança impediu que o Brasil cometesse mais um erro histórico. Numa COP onde sustentabilidade virou palavra-chave, criminalizar quem lida com o lixo seria desinformação ambiental com carimbo oficial.
Homenagem com sentido
Pela emenda, Alan Rick foi homenageado pelo INESFA – Instituto Nacional da Reciclagem, em evento realizado em São Paulo. A homenagem reconhece quem atua por uma transição ecológica real, com os pés no chão e não só nas planilhas dos fóruns internacionais.
A espera é por caneta
Enquanto isso, o projeto de saneamento do Acre, com recursos garantidos desde novembro, continua parado na mesa do prefeito Tião Bocalom. Falta apenas a assinatura do contrato. Só não falta problema ou oportunidade desperdiçada.
Norte fala alto
Durante a IFAT Brasil, maior feira de soluções ambientais da América Latina, Alan Rick subiu ao palco da ABREMA para lembrar que lixo também é pauta climática, especialmente quando 21 dos 22 municípios do Acre ainda convivem com lixões a céu aberto. “Não vim falar só de resíduos, mas de vidas”, disse. E cada frase dele, um soco educado.
Lixo, energia e justiça
No painel da COP30, o senador defendeu a valorização dos catadores, a produção de biogás a partir do lixo orgânico e os empregos verdes nas periferias. Propôs um consórcio intermunicipal com apoio federal, inspirado em experiências do Amapá, Portugal, Itália e outros estados brasileiros. "Cada lixão desativado é uma história que muda”, afirmou.
COP30
Com Belém prestes a sediar a Conferência do Clima da ONU, Alan Rick tem insistido: a transição ecológica precisa incluir os invisíveis, os que vivem do que a sociedade descarta. Não há justiça ambiental sem justiça social. Nem economia verde sem gente viva. E sem ouvir quem recolhe o que o país descarta, a COP corre o risco de virar só mais um evento com ar-condicionado.
*Socorro Camelo é jornalista e escreve neste espaço toda semana.
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